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Vale tudo para se manter saudável?

Como alguns esportistas conseguiram se manter em forma durante o afastamento social.
Reportagem de Janara Dolzanes 
Estudante do 5º período do curso de Jornalismo da Faculdade Martha Falcão
Publicado em 18 de junho de 2020
Foto: Reprodução - O celeiro
Durante a adolescência, a hoje jornalista Ana Graziela Maia da Silva, 32 anos, enfrentou problemas de saúde em sua coluna. Para reverter o quadro, era necessário usar um colete para tratar da doença, diagnosticada como lordose e escoliose. Nessa época, ela não tinha como costume fazer exercício físicos. Graziela foi criada por seu tio e por sua avó materna. Em 2012, o seu tio, Ondinei Balieiro, faleceu. Ela então ficou em choque com a perda, e como forma de superar e esquecer por uns momentos a dor, começou a caminhar. 

Depois Graziela começou a participar de maratonas, mesmo sem ter preparo físico ou orientação profissional. Quando a sua avó, Isabel Luiza Balieiro, então com 91 anos, ficou muito doente, Graziela resolveu sair do seu emprego para cuidar da idosa, que também veio a óbito posteriormente, deixando-a órfã, por assim dizer. Durante dois anos, ela ficou desempregada e foi a corrida que a manteve sã. “Comecei a participar de maratonas mais longas e a correr por horas para diminuir o meu sofrimento”, relembra Graziela.

Foi também durante a época de crise que ela conheceu a meditação, yoga, calistenia e dança. Com isso, Graziela começou a ter uma rotina, pois todos os dias era uma atividade física diferente. Sua mente mudou, seu corpo físico foi modificando junto, e a cada dia ela começou a entender a importância de fazer exercícios físicos. Suas dores foram diminuindo, lidar com o luto se tornou um pouco menos penoso e, de quebra, Graziela começou a receber muitos elogios. “Quando a gente quer fazer, a gente faz. Não precisa de dinheiro”, reflete. “Eu não vejo [as atividades físicas] apenas pelo lado estético, mas sim pela saúde. Os esportes me trouxeram uma qualidade de vida muito melhor do que eu tinha”.

Hoje ela trabalha na Polícia Militar do Amazonas (PMAM), no departamento de mídia. No seu ambiente profissional, ela é conhecida como maratonista, mas também como “a mulher da coxinha”, por conta da obsessão pelo salgado tipicamente brasileiro. Nas festas de comemoração do trabalho, ela come de tudo e em grande quantidade, e todos brincam e ficam admirados de como ela consegue ter um corpo tão bonito.

Os colegas acompanham um pouco de sua rotina de exercícios pelo Instagram. Quando ela chega no trabalho na segunda-feira, todos começam a comentar suas postagens e ficam curiosos em saber mais sobre seus exercícios. Ela também recebe mensagens de suas amigas pedindo dicas a respeito das atividades físicas que ela pratica.

Em família

Graziela incentiva seu pai de, 68 anos, e a mãe, de 67, a participar de maratonas por todo o Brasil. Sua última viagem com a família foi para Bento Gonçalves (RS), na qual correu uma maratona de 21Km. Seus pais participaram em uma corrida mais leve, de cinco quilômetros. Para Graziela, foi uma experiência inesquecível. Correu pelos vinhais, um sonho que sua mãe queria realizar. O trio já tinha várias viagens e maratonas programadas para o ano todo, mas tiveram que adiar todas devido a pandemia da Covid-19.

Durante o isolamento, não foram muitas as mudanças de Graziela em relação a sua rotina de exercícios físicos em casa. Muito antes da quarentena, seu dia começava às seis da manhã com a meditação, e quando chegava do trabalho á noite, fazia os outros exercícios mais pesados. Geralmente, ela faz seus exercícios na sala de estar, um cômodo com poucos móveis, e, por isso, perfeito para a prática. 

A única coisa que mudou é que hoje ela só corre às seis da manhã dos Sábados. Seu trajeto é de 10Km na Avenida das Torres. Ela se recusa a usar máscara, pois acredita que não existe ainda uma que se adeque à prática. “Não sinto medo de me contaminar, pois tenho tomado todas as medidas de prevenção, fazendo uma ótima alimentação e praticando a higienização adequada”, destaca.

É uma aposta arriscada, pois pesquisadores belgas e holandeses mostraram como a aerodinâmica pode impulsionar o alcance do vírus. Um estudo revelou que bastam algumas gotículas contaminadas, que se propagam no próprio ar, bastam para potencializar uma contaminação, caso o corredor ou ciclista não tome medidas preventivas, deixando um verdadeiro rastro da doença para quem vem atrás. Por isso, os pesquisadores estimulam a corrida lado a lado, que é capaz de minimizar os riscos de contaminação entre corredores. Para reduzir o risco de pegar ou passar o vírus, a saída apontada seria uma distância de pelo menos 2 metros entre os indivíduos.
 
O contato é o grande desafio dos esportistas durante a quarentena. Durante esse período, por exemplo, Graziela se inscreveu em seis cursos on-line, dentre eles o curso de yoga e de meditação. Mas o que mais lamenta é falta da dança. Antes, toda semana ela participava dos bailinhos, os momentos em que os amantes de dança se reúnem para sacudir o esqueleto. 

“Agora estou dançando só em casa. Lamento muito, sei que tão cedo não terei a oportunidade de participar desses eventos, porque a dança envolve muito contato físico, e lá seria impossível ter qualquer tipo de dança sem contato”. Desde o dia 19 de março, o governador do estado do Amazonas decretou o fechamento das academias para a diminuição do vírus, o que entrou em vigor no dia 23 do mesmo mês. 

“É uma boa medida de distanciamento social. Não é bom que tenhamos muitas pessoas ofegantes em um ambiente fechado, compartilhando os mesmos aparelhos”, explicou o virologista Paolo Zanotto, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP) em reportagem da Veja Saúde. O especialista explica que as salas de ginástica podem ser focos de contaminação através do compartilhamento de halteres, equipamentos, vestiários e outros. Porém, Zanotto alerta na reportagem: “Não podemos passar a impressão de que, durante um isolamento social, precisamos ficar sem fazer atividade física”. Caminhadas, corridas e atividades ao ar livre em horários de pouco movimento e muita luz também ajudam. 

Eu gosto é de puxar ferro!

Alzira Marques da Silva, 40 anos, empresária. Dona de um corpo para a lá de malhado, começou a treinar em 2007, aos 27 anos de idade. No início era apenas por vaidade, mas com o tempo ela foi se apaixonando pelos exercícios físicos. “Comecei por estética e fui vendo que não era só isso, era saúde, principalmente”, reforça Alzira. “Hoje não sou nenhuma modelo, um exemplo de corpo para ninguém. Não sou fisiculturista, mas alcancei o biótipo de corpo que eu gosto”. O amor pela atividade física foi tão grande que ela decidiu que iria se profissionalizar na área. Graduou-se em Educação Física, e começou a lecionar em uma academia como personal trainer e professora de hidroginástica. Ela seguiu o exemplo de outros atletas para alcançar o resultado esperado e o conseguiu, tudo foi aliado a um déficit calórico, treino, descanso e disciplina, mas nada muito rigoroso. “Não sou nenhuma atleta de nada, por isso não me prendo a dieta restritas, e sim a uma reeducação alimentar”, comenta.

Alzira atuou na área por cinco anos e viu que era um setor ainda muito desvalorizado, pois o salário era desproporcional aos seus gastos. Então resolveu seguir outra carreira. Atualmente, ela possui seu próprio empreendimento no ramo alimentício, sendo proprietária de um mercado. Viu que dá muito mais lucro e hoje tem qualidade de vida.  

Durante a pandemia, ela trabalhou diariamente. Por incrível que pareça, tem sido um período próspero, pois houve crescimento nas suas vendas, uma vez que as pessoas passaram a ficar mais em casa com suas famílias. Ela trabalha com toda a segurança possível, usando máscara e álcool em gel como forma de se prevenir.

Com a pandemia da Covid-19 causada pelo novo coronavírus, não apenas Alzira, mas muitas pessoas têm usado máscaras, seguindo as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Estas são uma forma apontada pelos estudos para impedir que infectados contaminem outras pessoas. Vale lembrar, inclusive, que muitos não apresentam sintomas, mas transmitem a doença, e outros tantos propagam a infecção antes mesmo de apresentar tosse, febre ou falta de ar.

Durante a pandemia, Alzira não parou suas atividades físicas. Como trabalhou durante um tempo em academia, ela fez uma amizade com a proprietária de uma, que permitiu que ela utilizasse os equipamentos. Foi liberado no local a presença de seis pessoas para fazerem musculação. Dois alunos pela manhã, dois alunos de tarde, e dois alunos à noite. Dois desses alunos são fisiculturistas e não podem parar de treinar, pois participam de campeonatos pelo Brasil. Durante os treinos todos usavam máscaras e álcool em gel nas mãos, além de álcool líquido para desinfetar os equipamentos e colchonetes.

Em período de academias e parques fechados, atletas estão encontrando dificuldades para manter o preparo físico e a forma em dia. Segundo pesquisa divulgada pelo portal Nexo, um atleta que fica de 4 a 6 semanas sem treinar pode perder até 10% da força e da potência dos músculos. Atletas de alto rendimento têm encontrado dificuldades para manter o corpo em exercício e evitar ao máximo a perda de desempenho. Há quem tenha conseguido alugar equipamentos para poder se exercitar em casa. Os atletas que não tiveram a sorte de ter academia aberta estão fazendo exercícios com equipamentos caseiros. Outro fator que preocupa os nutricionistas é que eles vêm percebendo que muitos estão desanimando um pouco, ficando muito ociosos e ansiosos. 

Alzira relata que não aguentaria ficar sem treinar, pois, desde que começou seus treinos, ela não sente mais nenhum dos problemas de saúde que costumava ter. Ela sofreu com reumatismo durante alguns anos, e quando começou a treinar, as dores sumiram. “Eu não gosto de treinos funcionais, de correr, de caminhadas, não gosto de nada disso. Como te falei, eu gosto de puxar ferro!”, brinca. O amor pelos exercícios físicos já dura 13 anos e ela não consegue mais imaginar viver a vida sem a academia. Pernas grossas e glúteo empinado são sua identidade. Para complementar o que já estava bonito, ela resolveu investir em prótese nos seios. Agora, mais do que nunca, sua autoestima está completa. E o mais importante: com saúde.

Academia como negócio

Muitas pessoas que estão longe das academias, não veem a hora de voltar, como a proprietária da Gfitness, Francimara Chagas de Moraes, de 47 anos. Ela começou a frequentar academia com 17 anos e passou por várias em Manaus: Sheik Club, Rio Negro, Olímpico Buildup e Studio Rioziman. “Sempre pensei em montar uma academia quando conseguisse um lugar meu, para evitar pagamento de aluguel e formar uma equipe que não escolhesse alunas por beleza, e sim, dar aula sem distinção de classe e ter muitas aulas no salão”, conta.

Foi então que no dia 25 março de 2018 Francimara realizou seu maior sonho: ter seu próprio empreendimento, que fica localizado na rua Vale do Sol, bairro Lírio do Vale 1. Selecionou vários professores para fazerem parte da sua equipe, dentre eles, Grace Silva e Williams Goiano, os profissionais fixos da academia. 

Em média, a Gfitness possui de 130 a 150 alunos, e durante o isolamento social, os alunos começaram a mandar mensagens pedindo ajuda. Eles sentiam a necessidade de manter o contato com os professores e sentir a aproximação da academia. Foi então que ela teve a ideia de fazer um grupo no whatsApp. “Durante a pandemia, montamos o segundo grupo por whatts, chamado de #AsFortesDaQuarentena, para diariamente passarmos vídeos, incluindo aulas de hit, exercícios corporais, funcional básico. Tentamos motivar os alunos a continuarem a se exercitar em casa, no intuito de cuidar da saúde e manter a massa magra, elevando sua frequência cardíaca e mantendo o condicionamento físico”, explica Francimara.

A proprietária da academia relata ainda que se as pessoas mantiverem 20 minutos diários é o suficiente para manter a saúde física e mental. “No mais, eu só tenho a agradecer a Deus por mais esse presente na minha vida, e continuar trabalhando no intuito de ajudar as pessoas a emagrecer, sair de depressão, fazer amigos, das muitas risadas juntas’’, comenta a empresária. 

Cada um ao seu jeito, os esportistas da pandemia buscam a manutenção da saúde física e mental, nem que isso signifique burlar algumas regras. Até que ponto isso influencia no aumento do contágio, ainda não é possível dizer, pois os estudos sobre a doença e seus efeitos ainda são todos iniciais. O que se pode dizer é que a atividade física no geral contribui para uma melhor imunidade em relação a muitas doenças. “Só sabe do gosto do efeito quem pratica exercícios e maratonas. Demorei muitos anos para ter os benefícios que hoje tenho. Minha flexibilidade foi gerada por muito sacrifício, meu corpo foi ganhando forma ao longo dos anos. Infelizmente as pessoas querem resultados rápidos, e não é bem assim. É necessário ter muita força de vontade e amor próprio para alcançar uma boa saúde. E preciso de foco e determinação”, conclui Graziela. Essas são duas características que, sem dúvida, todos precisamos nesses tempos de pandemia.
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