Ah, mais uma manhã de sábado. Descanso para alguns, mas para outros é momento de embarcar em vidas distintas. Mais uma manhã de sábado. Saída com os amigos para alguns, mas para outros é viagem pelo mundo.
Após o café da manhã, pego minha mochila da “Dora Aventureira”. Você deve se perguntar: por que o nome de um personagem em uma mochila? Na verdade, é apenas uma brincadeira das pessoas do grupo de teatro do qual participo, já que tem um mundo dentro da bolsa de um ator.
Antes de sair de casa, coloco nela tudo que preciso para mais uma manhã de ensaio: toalha de rosto, garrafa, escova de dentes, uma blusa reserva, sapatilha, meia, caderno, tênis de dança, toalha de banho, roupa para pós-espetáculo, maquiagem, e assim vai. Só depois disso, posso atuar. Mais uma manhã de sábado e ensaio, porque domingo tem estreia. Mochila da Dora Aventureira okay, roupa de ensaio okay, coque okay, falas decoradas e roteiro na mão okay. Agora sim, posso sair.
Sigo para a parada de ônibus na Cachoeirinha. Assim que entro no ônibus, olho para todos ao meu redor e percebo as pessoas me encarando. Penso comigo que deve ser normal, afinal, estou com roupa de ensaio e uma mochila gigantesca nas costas. Quem não chamaria atenção desse jeito? Caminho em direção ao assento, olho pela janela e observo que o céu está diferente hoje devido às milhares de borboletas que estou sentindo dentro da barriga por conta do ensaio e estreia da peça. O céu está mais azul do que o normal, com várias nuvens branquinhas sorrindo para mim.
Com o vento no rosto, sigo feliz para o ensaio. Feliz porque estou indo fazer o que mais amo nessa vida, que é atuar. Olhando pela janela, me perco nos meus pensamentos. Sonho acordada com o dia da estreia e quase esqueço de descer na Avenida Paraíba. Desesperada, me levanto e puxo o sinalizador de parada. Desço em frente ao Manauara Shopping, apressada e ansiosa, sem olhar para as pessoas ao meu redor que, se já me olharam esquisito quando entrei no ônibus, deviam estar olhando mais esquisito ainda agora. Atravesso a rua e sigo em direção ao teatro, que fica dentro do próprio shopping, para dar início a um longo dia de ensaio, das 9h às 23h, até porque domingo já era estreia.
Com a entrada autorizada apenas para os atores, assim que cheguei no shopping, dei bom dia para o segurança. Naquele momento, aquele lugar era diferente das outras vezes porque naquele dia eu era uma atriz prestes a estrear com atores de renome. A ficha não caia de que os protagonistas da peça eram Felipe Simas e Juliana Korand. Logo avistei meus colegas de atuação. Somos todos iguais nesse momento. Ao descer as escadas, cumprimento cada um deles com muita alegria. Conversamos por alguns minutos até o diretor da peça chegar.
Começou o ensaio intensivo. Não foi fácil, o diretor pegava muito pesado com todos nós. Em alguns momentos, a vontade de chorar era grande, porque o medo de errar era grande e o de decepcionar, também. E assim o ensaio ia acontecendo. Erra o texto, acerta o texto, decora a marcação de palco, bebe uma água, volta pra cena, experimenta figurino, troca figurino, deixa o chororô de lado, confiança em si mesmo, advertência do diretor, e assim foi. Ao final, tudo valeu a pena. Estávamos preparados para a estrear e a sensação era ótima.
Chegou a grande noite de estreia. No teatro, tinha um camarim enorme para todo o elenco, um banquete incrível, e o cenário estava espetacular. Tudo aquilo só podia ser um sonho. O frio na barriga aumentava demais o medo de esquecer a fala. A emoção à flor da pele, mil sentimentos. Era um nervosismo bom.
O primeiro sino tocou, agora deu a largada! Na coxia, todos demos as mãos, olhamos uns para os outros e começamos a gritar a frase “Eu acredito em você” para encorajar uns aos outros. Enquanto falávamos isso, era impossível segurar as lágrimas.
Tocou o terceiro sino, era o momento, estava acontecendo. Subimos no palco, agora era a hora de conquistar o público com os nossos personagens. A peça começou e era algo inexplicável o que sentia quando estava pisando naquele lugar, cena após cena. A emoção era forte.
Quando a peça chegou ao fim, um sentimento de dever cumprido reinou. As cortinas se fecharam após a última cena, e em seguida todos se abraçaram. Gritamos: “Conseguimos!”.
Nos posicionamos novamente no palco. Quando a cortina reabriu e encaramos o público, foi mágico! A casa estava cheia, milhares de pessoas tinham ido nos assistir. Era uma sensação única, todos aplaudindo e gritando. Naquele momento fomos reconhecidos como artistas, e não existe sensação melhor do que essa para um ator. Depois de tantos sábados de ensaio, o reconhecimento.