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A Indústria das invasões de terras e suas consequências para o Meio Ambiente e Economia na Amazônia

O descaso ambiental e os danos causados por ocupações ilegais no mercado da invasão.


Socorro Maia/ redação- portalfalcon.com
Publicado 4 de Novembro de 2019

Invasão comunidade Torquato Tapajós - Foto: Iara Guerini

- Corre menino vai tomar banhooo!!!berra a mulher com o filho que passa correndo no meio das valas da lama do esgoto a céu aberto da invasão “Comunidade Torquato Tapajós " em Manaus.

O menino não pára de correr e a mãe vai lá e dá umas palmadas no garoto ficando um berreiro só .

E lá estava eu, no meio da invasão, cercada de casas com lonas, casebres construídos com pedaços de madeiras e sem nenhuma infraestrutura, não tinha luz, água, e era no barro, não tinha asfalto, mais de 50 famílias morram na invasão. Quando descobri que iria fazer uma pauta em uma invasão, eu digo a vocês que fiquei com medo sim. 

A Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semmas) afirmou que há quatro anos foram registrados 51 focos de invasão em Manaus, mesmo com o monitoramento constante dois anos depois foram registrados mais de 32 ocupações ilegais. 

No dia da pauta acordei bem cedo, pois já não consegui dormir à noite mesmo, fiquei pensando como chegar no local de forma discreta e pacífica, lembrei do pastor que conheci e que também já tinha morado naquele lugar para evangelizar os moradores. Fui em busca do pastor que prontamente aceitou me acompanhar, fiquei mais aliviada pois naquela altura do campeonato ele seria uma espécie de bandeira branca amor eu quero  paz!

Momento tenso na chegada no local da Invasão Comunidade Torquato Tapajós - Foto: Iara Guerini
Após chegar no local da invasão, fomos abordados logo na entrada por dois homens sem camisas que foram gritado: 

Eiiii!!!! o que vocês querem aqui? Não pode filmar aqui não heim!!!  

Senti minha respiração ofegante, um arrepio na costela, um frio na barriga, tudo junto e misturado. Esse mercado de ocupação é criminoso. Existe um comando de comercialização de terras ocupadas irregularmente, que segundo a polícia, pode está ligado ao crime organizado.

 Eles estavam de short e sem camisa, foram se aproximando do nosso carro e as minhas pernas começaram a tremer. O pastor que estava comigo disse:

  - Calma nos viemos em paz, estamos apenas fazendo umas fotos para um projeto da faculdade dela, ninguém vai publicar nada na imprensa.  

Enquanto o pastor conversava com o líder da invasão, um rapaz moreno, magro de cabelo raspado, calça jeans desbotada tinha aproximadamente uns 30 anos, eu olhava para todos os lados e o que pude observar foi um lugar sinistro, com cheiro de fumaça, com destruição de áreas verdes, e com pessoas com olhares desconfiados, muitas sem dúvida alguma eram envolvidas com crime organizado.

Nas últimas décadas várias invasões ocorreram em Manaus e junto com elas o desmatamento de vários quilômetros quadrados de vegetação um verdadeiro caos ambiental. Enquanto o pastor continuava a falar baixinho com eles; discretamente tirei o meu celular e comecei a fotografar os barracos que já estavam erguidos sem que eles percebessem. No entanto foram ficando irritados e mandaram que fossemos embora dali.

O pastor sinalizou com o olhar, para que fossemos saindo, pelo jeito a conversa não foi boa. Em poucos minutos olhei para cima e em uma parte alta da invasão notei que estávamos cercados por pessoas que nos observam com olhares raivosos.

Saímos do local da invasão com a condição da não falarmos o nome do líder que estava conversando com o pastor, mesmo em meio ao nervosismo e medo, eu consegui fazer as fotos, algumas ficaram desfocadas, mas serviram.

As ocupações irregulares de terras em Manaus, destroem a vegetação nativa. Mas não é apenas a degradação ambiental da cidade que está sendo brutalmente invadida e muitas vezes morta, de acordo com a Delegacia do Meio Ambiente a polícia investiga ação de milícias em invasões no Tarumã, na Zona Oeste de Manaus de Manaus, pelo menos 500 famílias vivem numa área que foi usada na extração de minérios, os ocupantes da área que já destruíram a fauna e a flora daquele lugar de preservação, afirmam que à noite aparecem homens encapuzados e ficam vistoriando o local.

Comunidade Torquato Tapajós

 Fotos Iara Guerini

O destino agora é o rumo da invasão Monte Horebe, Zona Norte de Manaus, atrás do conjunto Viver Melhor, por lá as coisas estão feias, ao menos quatro corpos foram encontrados na invasão, o policiamento foi reforçado a Força Tática apreendeu um fuzil AK 47, duas pistolas, dois revólveres e munições escondido na casa de um morador.

Entrei no local como parente de Dona Maria, que tem em seu registro geral (RG) o nome de Maria Antônia Costa de Azevedo, nervosismo, tensão, medo, tudo isso me representava. Ela estava esperando na entrada da comunidade, a casa dela era logo no início da invasão, pediu para entrar no casebre e  ofereceu café.

Com os seus cabelos brancos, um perfume forte, ela  serviu o café e sentei para ouvir a sua história. Dona Maria veio lá de Marabá no Pará, uma mulher com expressão cansada, rosto enrugado, o olhar triste e melancólico, revela como é viver  os seus 44 anos  saindo da situação de miséria para um perigo maior que são as ocupações de terras, casada criou  com muito sacrifício quatro filhos. 

Dona Maria conta que quando chegou na invasão do Monte Horebe, ainda existiam muitas florestas, tinha um cheiro gostos de mato.

 - Quando amanhecia as árvores pareciam felizes, molhadas do sereno, seu verde parecia mais verde tinha um cheiro gostos de mato! Eu nasci no Pará e vim para o Amazonas com sete anos de idade com meus pais e irmãos, meu pai veio para o interior do estado trabalhar na plantação de juta, não tínhamos muito recurso e desde de muito nova, ajudei minha mãe a cuidar de meus irmãos, quando perdi meu pai e minha mãe tive que cuidar de meus irmãos e onde morávamos, os recursos eram bem escassos, morávamos na beira do rio, sem energia elétrica e água tratada, foi então que resolvi vir pra Manaus com meus irmãos.

Ela teve uma vida muito sofrida, passavam fome. Manaus era um esperança de dias melhores para sua família, com os olhos cheios de lágrimas ela continuou: 

Não tínhamos pra onde ir nem onde morar, conheci meu esposo que já participava de ações de invasões de terra, mas tudo dentro da legalidade. Aqui em Manaus, as ocupações feitas por essas pessoas (MST), são de fato, para pessoas que precisam de uma moradia.

Invasão Monte Horebe, atrás do Conjunto Viver Melhor, na Zona Norte de Manaus- Foto: SSP-AM

Maria  foi uma das primeiras moradoras ela disse que lá dentro da comunidade eles sempre viviam cumprindo regras dos líderes do movimento.

- No começo tudo era mais difícil, não tínhamos água, nem energia elétrica, fazíamos uma cota em dinheiro para que pudéssemos ter água, energia era bem mais difícil de conseguir. No início os acampamentos tinham regras, e cada um fazia uma coisa, e quando não cumpria as regras era expulso da comunidade. Tinha uma preocupação enorme para que todas as famílias tivessem os mesmos direitos que qualquer outra.

O dia estava quente e o suor ensopava a minha blusa, continuei  a conversa com a Dona Maria, e agora ela serviu bolacha de motor para tomar café. Foi quando abordei o assunto que o MST teria sido acusado em 2016 pelo Ministério Público de estar envolvido com milícias, uma espécie de estado paralelo e isso seria a causa das mortes e ações de segurança no local. Ela franziu a testa e respondeu com um tom meio bravo.

- Olha esse negócio é difícil de falar disso, eu tenho pra mim que nada disso foi comprovado, é verdade que temos pessoas aqui que dizem que são os donos do lugar, quando chegamos aqui, a entrada de armas e bebidas eram proibidas, mas a quantidade de famílias foi crescendo e eles perderam o controle e virou isso ai que você está vendo. Hoje a realidade é bem diferente, tivemos aqui a entrada de facções que passaram a pegar  jovens para trabalhar no tráfico, e como eles não tem dinheiro para comer, são  presa fácil para serem manobrados por eles.

Dona Maria tem razão, no dia 25 de setembro uma ação policial integrada, entrou na invasão para apurar crimes ambientais praticados na área, o trabalho foi desenvolvido pela Polícia Civil, Polícia Militar e Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam).

Ação das polícias Civil e Militar apura crime ambiental na invasão Monte Horebe. Foto: Roberto Carlos/ Secom
Foi constatado no local vários crimes ambientais, como desmatamento e queimadas recentes, destruição de Áreas de Preservação Permanente e construção em local não edificáveis. Além dos crimes ambientais, a Polícia Civil apura o envolvimento de criminosos em outros delitos . A polícia tem informação de que há uma liderança de organização criminosa que atua em homicídios e tráfico de drogas. Isso está sendo investigado junto com o Departamento de Repressão ao Crime Organizado.

Dona Maria tira um cigarro e começa a baforar, foi quando criei coragem e perguntei se ela sabia que o MST é acusado de invadir terras produtivas em todo país e ameaçar fazendeiros. Ela fica olhando para o chão, respira fundo e responde:

- Conversa, isso não existe, esses conflitos num existem, no início éramos vistos como um movimento, bagunceiro e desordeiro, mas nunca fomos, hoje sofro com essas mazelas que só acontecem por aqui, a realidade é bem pior do que muitos imaginam.


O que a Dona Maria não sabe é que os conflitos entre o MST e os fazendeiros existem há mais de 20 anos impactando diretamente a economia de algumas regiões, são mais de 130 mil famílias em 22 estados brasileiros.

Ação das polícias Civil e Militar apura crime ambiental na invasão Monte Horebe. Foto: Roberto Carlos/ Secom

Notei que ela não gostou da pergunta, esse final da conversa deixou um pouco a Dona Maria agoniada, e então fui logo encerrando. Eu agradeci a sua atenção e em seguida ela me acompanhou até a entrada da comunidade e voltei para o carro. Com um alívio, respirei fundo e segui para casa.

A Amazônia é de quem mesmo?

Quando cheguei em casa que acessei as minhas redes sociais. Meu pai do céu! estava uma briga na internet sobre a Amazônia. A internet estava pegando fogo, eram imagens e fotos da Amazônia em chamas pra todos os lados do planeta terra. 

Era um tal de Amazônia é nossa pra cá, Amazônia é nossa pra lá, lembrei que tudo que observei nos lugares que passei foram terras sem leis, bem no meio da Amazônia e todas com demarcações de territórios e lá o mundo era real, não era virtual.

Logo percebi que a maior floresta tropical do mundo estava no meio de uma disputa de interesses e a internet como sempre não apaziguava, muito pelo contrário: jogava mais gasolina nas chamas. 

 Eu fui tentar me localizar no meio da confusão e logo dei de frente com um tuíte do presidente do Brasil Jair Bolsonaro que estava atirando para todos os lados, depois do estardalhaço de notícias internacionais sobre as queimadas no Brasil. 

Jair disse que as organizações não governamentais (ONGs) poderiam estar por trás das queimadas na região amazônica para "chamar atenção" contra o seu governo. Tudo porque o presidente tirou o repasses de 40% que ia para ONGs. 

Com aquele jeito diplomático Bolsonaro disparou contra as ONGs: 

- Não tem mais dinheiro para eles, tá okei?  

O presidente falou que esse pessoal está sentindo a falta do dinheiro que ele cortou.

Bolsonaro faz associação que ONGs podem estar envolvidos nas queimadas da Amazônia
(foto: Evaristo SA) 

E para completar essa confusão toda ainda estávamos em meio a uma crise diplomática entre Brasil e França. Jair Bolsonaro declarou para a imprensa  que o Presidente Macron tem tentando se cacifar perante o mundo com um discurso em defesa da Amazônia. Segundo ele, essa bandeira não é dele, mas do Brasil.




 Críticas, agressões e ofensas redes sociais pegam fogo!



A briga de Bolsonaro com o presidente da França começou no dia 22 de agosto, quando Macron defendeu em seu Twitter que as queimadas na Amazônia entrassem na pauta do G7. Nossa casa está pegando fogo. Literalmente. A floresta amazônica os pulmões que produzem 20% do oxigênio do nosso planeta está em chamas. É uma crise internacional." Tuitou Macro.




No mesmo dia, Bolsonaro respondeu no Twitter que lamentava que Macron "busque instrumentalizar uma questão interna do Brasil e de outros países amazônicos para ganhos políticos pessoais. O tom sensacionalista com que se refere à Amazônia (apelando até para fotos falsas) não contribui em nada para a solução do problema". Macron havia usado em seu post uma foto da Floresta Amazônica feita por Loren McIntyre, fotojornalista da National Geographic que morreu em 2003.  



Isso foi o suficiente para explodir o debate nas redes sociais, não era somente a floresta que estava pegando fogo, as chamas estavam se espalhando pela internet também, e a hashtag #prayforamazonia que significa reze pela Amazônia, subiu e ficou em primeiro lugar entre as mais citadas no Twitter no mundo.  

O incêndio cresceu e atingiu  a primeira-dama francesa, Brigitte Macron, de 66 anos.Bolsonaro respondeu ao comentário de um seguidor que comparou a beleza da esposa de Macron à de Michelle Bolsonaro, que é 29 anos mais jovem.



Vamos apartar essa briga e falar a verdade: 

De acordo com dados Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) Desmatamento na Amazônia em agosto cresce 222% em relação a 2018, a área desflorestada da Amazônia nos oito primeiros meses de 2019 chegou a 6.404 quilômetros quadrados, número 92% superior ao registrado no mesmo período do ano anterior (3.337 quilômetros quadrados).

 O desmatamento na Amazônia é 96% maior em setembro de 2019, em comparação com setembro de 2018, Dados da plataforma mostram que a devastação subiu 92,7% entre janeiro e setembro deste ano, em relação ao mesmo período no ano anterior. Foram 7.854 km² destruídos nos primeiros nove meses de 2019, enquanto 2018 registrou 4.075 km² de desmate. 


Imagem de satélite do Inpe mostra focos de queimadas na região amazônica Foto: Reprodução/Inpe  


De acordo com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Ministério do Meio Ambiente (MMA), o período é que assiste o maior número de queimadas. "Historicamente, 95% dos incêndios que ocorrem em todo o país se concentram no segundo semestre de cada ano, principalmente entre agosto e outubro. O pico ocorre geralmente em setembro”, detalha nota publicada na última quinta-feira (3) pelo MMA.

O ministério atribui a queda à “presença de mais de mil brigadistas do Centro Nacional de Prevenção e Combate a Incêndios Florestais (Prevfogo)”. Além dos brigadistas, o governo federal mobilizou o Exército para combater o fogo na Amazônia e liberou R$ 38 milhões para ações de controle dos incêndios.

A Força Nacional de Segurança Pública vai permanecer por mais 180 dias, no período de 20 de outubro até 16 de abril de 2020, em apoio às ações de fiscalização do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade ICMBio, conforme portaria do Ministério da Justiça e Segurança Pública, publicada no Diário Oficial da União na última quinta-feira (17).Para o presidente do ICMBio, Homero Cerqueira, o apoio da Força Nacional é fundamental para garantir a segurança dos fiscais nas ações de fiscalização dentro das unidades de conservação na Amazônia.

As ações de fiscalização serão em caráter episódico e planejado. A quantidade de militares ser disponibilizados obedecerá ao planejamento definido pelo ministério. A portaria diz ainda que o prazo do apoio prestado pela Força Nacional poderá ser prorrogado, caso seja necessário, cabendo ao ICMBio o apoio logístico e disponibilizar a estrutura necessária aos militares.



Colaboradores: Iara Guerini,Marcos Sérgio,Gabriel Martins e Ivan Neto.

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